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Preservação de Áudio 1: Introdução à preservação de áudio

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Quer saber sobre como preservar áudio de maneira consistente e ao mesmo tempo simples?

 
A partir de hoje vamos começar uma série de artigos com o resumo dos principais tópicos de um excelente guia voltado para a preservação de áudio. Assinado pela Association for Recorded Sound Collections, o ARSC Guide to Audio Preservation é uma ótima ferramenta de apoio para que possuem documentos sonoros em sua coleção ou acervo, sendo um manual básico e de leitura fácil.

 

 

O guia tem como objetivo fornecer conhecimentos, técnicas básicas e, sobretudo, confiança para que possamos preservar os registros sonoros ao longo do tempo.

 
O guia pretende auxiliar instituições públicas e privadas, assim como colecionadores particulares, que mantêm registros sonoros em seus acervos, mas que carecem de base profissional em uma ou mais áreas para preservá-los. O guia é, portanto, uma introdução aos princípios e práticas da preservação de áudio.
 
Nestes artigos, você terá acesso às informações do guia que considero mais importantes, acrescidas de comentários meus que possam tornam o entendimento mais claro.
 
Estes são alguns dos temas que iremos abordar ao longo desta série de artigos:
 
  • Introdução à preservação de áudio
  • Formatos de áudio: características e fatores de deterioração
  • Critérios de avaliação e priorização
  • Cuidados e conservação (manuseio, limpeza, acondicionamento, armazenamento, reprodução etc.)
  • Descrição dos registros de áudio (metadados)
  • Reformatação para preservação (digitalização)
  • Prevenção de desastres, preparação e resposta
Sobre a ARSC: a ARSC é uma organização norte-americana sem fins lucrativos dedicada à preservação e ao estudo dos registros sonoros de todos os tipos. Fundada em 1966, a ARSC reune indivíduos e instituições, desde arquivistas, bibliotecários e curadores, até colecionadores particulares, engenheiros de som, músicos e historiadores.
 
► O ARSC Guide to Audio Preservation está disponível gratuitamente para download em PDF aqui.
  
Na parte 1 dessa série de artigos, vamos começar pelo início: uma introdução à preservação de áudio, destacando quais são os principais desafios hoje que cercam esse campo. 

E, ao final, haverá também duas seções a parte: uma sobre os princípios básicos de acústica; e outra contendo um pequeno histórico dos principais formatos de áudio. Considero que essas duas seções, apesar de breves, são muito importantes como uma base, para quem tenha a pretensão em se aprofundar um pouco mais na preservação de áudio.
 
E não deixe de escrever seu comentário lá embaixo, ao final deste texto.
 

 
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Preservação de Áudio – parte 1:

Introdução à preservação de áudio

 
Boa parte dos profissionais de arquivo costuma trabalhar mais com materiais em papel e pode não ter as habilidades e os recursos necessários para a preservação de áudio. Muitos podem se sentir intimidados ao encontrar acervos com fitas antigas, discos de acetato ou HDs contendo centenas de arquivos digitais de áudio.
 
Obviamente que este é um panorama que vem se modificando nos últimos anos, com arquivistas e outros profissionais da área pouco a pouco se especializando nesse tipo de conhecimento. No entanto, assim como no caso de todos os materiais audiovisuais, há ainda um longo caminho a ser percorrido para um maior aprofundamento nas melhores práticas da preservação de áudio.
 
Podemos resumir em 3 os principais desafios da preservação de áudio hoje:
 
  • falta de recursos;
  • mudanças constantes provocadas pelo surgimento de novas ferramentas e tecnologias;
  • treinamento insuficiente de profissionais, geralmente mais bem preparados para a conservação de materiais em papel.
Podemos observar que a satisfação que temos ao escutar ou produzir registros sonoros infelizmente não vem sendo acompanhada pelo nosso comprometimento em preservá-los. Gravar um som é algo cada vez mais corriqueiro e prático na era digital em que vivemos, mas estamos nos preocupando muito pouco em como os registros que estamos fazendo vão sobreviver nas próximas décadas.
 
Por estarem tão presentes na vida moderna, talvez não tenhamos a noção do quão suscetíveis os registros sonoros são à deterioração e à perda. Embora alguns formatos durem mais do que outros, todos estão sob risco.
 
Em relação aos suportes sonoros analógicos (como discos e fitas), os níveis de risco podem variar de acordo com:
 
  • a sua composição física;
  • as condições de armazenamento ao longo do tempo;
  • a disponibilidade dos equipamentos de reprodução e do conhecimento sobre como utilizá-los.
Quantas pessoas hoje são capazes de operar, com a mínima destreza e conhecimento, um gravador de fita de rolo, por exemplo?
 
Embora as gravações analógicas antigas representem desafios de preservação gigantescos, os formatos e suportes digitais utilizados hoje também estão sob risco. HDs e servidores quebram; bits se perdem; e suportes como CDs podem empenar, arranhar, oxidar e sofrer danos provocados pela luz ou pelo calor.
 
Além disso, os arquivos digitais gerados por uma versão específica de um software de edição de áudio podem se tornar ilegíveis em versões posteriores do mesmo software. Portanto, tanto a fragilidade dos formatos quanto o processo de obsolescência que os atinge são características de todas as mídias, sejam analógicas ou digitais (incluindo os arquivos digitais).
 
Ao longo de 125 anos da história da indústria fonográfica e da gravação sonora, a praticidade muitas vezes prevaleceu no mercado sobre a qualidade da fidelidade sonora. Antes do surgimento dos CDs, por exemplo, houve um período em que as fitas cassete de áudio superaram os LPs em vendas, principalmente pela facilidade de poderem ser tocadas em automóveis e em Walkmans — apesar da sua qualidade inferior.
 
Se o modelo de negócio baseado em áudio via streaming prevalecer sobre a venda de objetos físicos, de que forma as bibliotecas, os arquivos e os colecionadores poderão garantir que as gravações serão preservadas? Portanto, o crescimento do streaming também ameaça a preservação dos registros históricos.
 
O imenso volume de áudio digital na internet, a natureza efêmera dos recursos online, bem como o esforço e o custo necessários para preservar áudio criam uma situação na qual as perdas do nosso legado sonoro podem ser catastróficas.
 
São muito poucos os projetos voltados para preservar o imenso volume de áudio digital disponibilizado e armazenado na internet, nas mais diversas plataformas. Sem contar o fato de a quase totalidade desses registros estarem armazenados em serviços oferecidos por empresas, que podem encerrar suas atividades a qualquer momento, não havendo a garantia de que as informações serão recuperadas.
 
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Da década de 1950 até a década de 1980, as fitas de rolo de 1/4 de polegada eram as mídias preferidas dos profissionais. Nunca entendida como sendo definitiva, a fita magnética era considerada a mídia mais acessível economicamente para a preservação de longo prazo. Durante todo o tempo, a expectativa era de que a ciência moderna fosse desenvolver algo como uma mídia permanente e definitiva.
 
Isso nunca ocorreu, pelo contrário, no início da década de 1990, muitas fitas que eram matrizes de preservação não puderam mais ser reproduzidas porque estavam sofrendo da chamada síndrome sticky shed (hidrólise), na qual o aglutinante que sustenta as partículas magnéticas se rompe.
 
Enquanto isso, as gravações digitais estavam em ascensão. No final da década de 1980 e início da década de 1990, tanto o DAT (Digital Audio Tape) quanto o CD-R (disco gravável) foram considerados promissores enquanto mídias de preservação, mas provaram não ser confiáveis para fins de arquivamento.
 
Com o crescimento do áudio digital e do desenvolvimento dos sistemas de armazenamento voltados para a preservação, engenheiros de som e arquivistas passaram a entender que o futuro da preservação sonora não depende de um formato físico, mas de uma estratégia — um processo contínuo de seleção, digitalização, gerenciamento de sistema e migração para novos formatos.
 
Isso fez com que os preservacionistas de áudio pudessem, pela primeira vez, fazer uma distinção entre o som em si (o conteúdo) e a mídia na qual ele está armazenado (o suporte). Essa abordagem da preservação de áudio se tornaria uma prática comum já nos primeiros anos do século XXI.
 
Uma vez que, pela própria natureza dos registros sonoros, as mídias se tornam obsoletas e dependem de máquinas para a sua reprodução (que também ficam obsoletas), uma saída possível para esse impasse foi justamente utilizar uma abordagem que pudesse se centrar mais na extração do conteúdo — ainda que a manutenção do suporte continuasse tendo relevância.
 
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Estamos passando agora por um período crítico de transição. A infraestrutura e os recursos atuais necessários para sustentar esses processos estratégicos não são adequados. Nos faltam conhecimentos básicos sobre a quantidade e as condições dos registros sonoros armazenados, tanto em instituições públicas, quanto em ambientes privados.
 
Não fizemos a tarefa básica de conhecer e inventariar minimamente os nossos acervos de documentos sonoros, algo que tornaria o trabalho daqui para frente muito menos complexo. E com a chegada do digital esse cenário se tornou ainda mais dramático, uma vez que os dados digitais vêm sendo gerados em um volume infinitamente maior do que durante a era analógica, e em maior velocidade.
 
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Alguns princípios básicos de acústica

 
O som é um fenômeno acústico. Trata-se de vibrações que viajam através de uma mídia, como o ar, e pode ser escutado pelo ouvido humano. Uma pressão sobe e desce em um padrão regular e é propagada para fora. Quando nos referimos a áudio ou a sinal de áudio, geralmente estamos tratando de uma representação elétrica ou mecânica do som.
 
Digitalização é o processo de capturar sinais contínuos (o domínio analógico) e transformá-los em sinais discretos (o domínio digital). O áudio digital é baseado na taxa de amostragem (sampling rate) e na profundidade de bits (bit depth). A taxa de amostragem se refere a quantas vezes por segundo um sinal contínuo é amostrado, também podendo ser expresso em Hertz (amostragens por segundo). Quanto maior a taxa de amostragem, maior é a resposta de frequência de um sinal (os limites de graves e agudos).
 
O número de bits utilizado para cada amostragem, chamado de profundidade de bits (bit depth), determina a precisão com que se pode representar as amplitudes de amostragem. Uma profundidade de bits maior terá mais nitidez, menos ruído e uma faixa dinâmica mais ampla.
 
16-bits/44.1-kHz é o padrão para CDs de áudio. Entretanto, aprimoramentos na tecnologia possibilitaram profundidades de bits e taxas de amostragem melhores, como, por exemplo, 24-bits/96-kHz. Profundidades de bits e taxas de amostragem maiores ajudam a manter a integridade do áudio quando do processamento de arquivos sonoros digitais.
 
Medida em decibéis, a faixa dinâmica é o intervalo entre a maior e a menor amplitude que pode ser reproduzida de maneira precisa (ou seja, da mais silenciosa até a mais alta).
 
O MPEG-2 Audio Layer III (conhecido como MP3) é um formato com perda (lossy) que se apoia na psicoacústica (a ciência da percepção sonora) para compensar a perda da informação, de modo que apenas os dados detectáveis pelo ouvido humano possam ser armazenados.
 
Áudio digital comprimido com perda (lossy) não é adequado como um formato de preservação. Há um amplo consenso entre os profissionais de que arquivos digitais para armazenamento de longo prazo devam ser arquivos no formato Broadcast Wave Format (BWF) sem compressão. Entretanto, um arquivo MP3 pode ser adequado para acesso do público, como por meio de streaming.
 
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História dos Formatos de Áudio
 
Esta é uma breve cronologia da introdução dos formatos sonoros mais comuns encontrados em bibliotecas, arquivos sonoros e coleções particulares.
 
A Era Acústica
 
1889
A North American Phonograph Company lança os cilindros de cera marrom. Destinados originalmente para ditados de escritório, acabaram sendo utilizados para entretenimento e para gravações domésticas.
 
1893
A Gramophone Co., de Emile Berliner, inicia a venda de gravações feitas em discos planos, produzidos em massa, para entretenimento doméstico.
 
1900-1902
Cilindros moldados (isto é, produzidos em massa) são lançados.
 
A Era Elétrica
 
1925
Grandes companhias fonográficas começam a utilizar microfones e amplificadores elétricos em processos de gravação e reprodução, os quais resultam em registros de maior fidelidade. A velocidade de gravação dos discos é padronizada em 78 rpm.
 
Final dos anos 1920
Gravações instantâneas em discos de alumínio virgens possibilitam a feitura de gravações individuais personalizadas. São utilizadas para gravar programas de rádio, gravações domésticas, registros etnográficos de campo, e muito outros gêneros. Com a introdução do disco revestido de laca e do gravador portátil da marca Presto entre 1934 e 1935, dezenas de milhares de discos são produzidos a cada ano até o final dos anos 1940, quando a fita magnética substituiu a mídia.
 
1940
Gravações magnéticas em fio de arame destinadas a uso comercial são apresentadas. São utilizadas pelo governo norte-americano durante a II Guerra Mundial e comercializadas para o público depois da guerra.
 
1948
O uso comercial disseminado da fita magnética começa nos Estados Unidos. O formato de rolo em carretel aberto é utilizado para pré-gravar programas de rádio, e a fita magnética acaba substituindo os discos enquanto mídia destinada à geração de uma matriz de gravação comercial.
 
1948
Componentes feitos de policloreto de vinila (vinil) começam a substituir a goma-laca na fabricação de gravações comerciais.
 
1948
A Columbia Records lança um disco de longa duração (long-playing) que utiliza um (micro) sulco estreito girando a 331/3 rpm, possibilitando que a gravação em um lado tenha 20 minutos de duração ou mais. É chamado de LP ou álbum (este nome é oriundo dos antigos álbuns de discos de 78 rpm).
 
1949
A RCA Victor lança o disco de 7 polegadas de longa duração, que toca a 45 rpm, como um concorrente do LP da Columbia.
 
1964
A fita cassete compacta de áudio da Philips começa a ser vendida nos Estados Unidos.
 
1972
São lançados os conversores de modulação por código de pulso (PCM – Pulse-code modulation) que permitem que o áudio digital seja gravado em videoteipe.
 
1980
O Walkman, player cassete da Sony, é lançado nos Estados Unidos.
 
A Era Digital
 
1982-1983
Os discos (CDs) e players compactos de gravação digital são lançados no mercado consumidor.
 
1986-1987
A fita digital de áudio (DAT ou R-DAT) é lançada. Destinada a substituir as fitas cassete analógicas no mercado consumidor, não é um sucesso de vendas. Entretanto, é amplamente utilizada em gravações profissionais.
 
1990
O disco compacto gravável (CD-R) é lançado.
 
1997-1998
O Winamp, player gratuito para arquivos de MP3, é lançado, seguido pela proliferação de arquivos de áudio de MP3 — um formato de compressão com perda criado para facilitar a distribuição de áudio pela internet.
 
2003
A Apple inaugura a iTunes Store, sua loja online, que consegue atenuar as perdas do mercado fonográfico provocadas pela pirataria, mas que ao mesmo tempo faz cair as vendas das mídias físicas.
 
2011
As vendas das gravações sob a forma de mídias físicas ou arquivos digitais caem, enquanto que os serviços de assinatura de música via streaming ganham popularidade.